As regras do meu mundo
Há tempos temos vivido dias difíceis, eu sei, lutando arduamente pelo futuro, “matando um dragão por dia”, como dizem por aí. Há dias em que é impossível não ficar esgotado, e isso não exclui a obvia covardia que me ocorre nesse momento, embutida nas palavras dessa madrugada, exceto pela ausência, distante, vazia e saudosa, que me destrói lentamente por dentro, sem que eu tenha alguma culpa declarada. Acho que, desde sempre, era isso o que eu mais temia, que eu ficasse, de repente, tão ocupada com minha vida em detalhes até perder a capacidade de vivê-la em essência.
Confesso que às vezes me surpreendo com minha vontade de desaparecer, não ter vontade de nada é um dos piores sentimentos que existe. Até encontrei o exemplo que me faltava pra entender um pouco mais sobre tudo isso, embora não queira com isso dizer que exista uma pessoa perfeita porque não existe ninguém perfeito, mas certamente, como quase sempre ocorre, a minha visão das coisas faz com que tudo se perca. Imaginei que o sonho fosse realmente imortal e descobri lentamente que existe um universo paralelo, que por estar situado, freqüentemente, mais no mundo das idéias do que no nosso mundo real, um dia a gente acaba descobrindo que o nosso herói tem pés de barro, mas na verdade ele nunca foi de verdade, entende? Então por que em vez admitir essa coisa toda, não poderíamos viver o sonho? Ou será que achar que se pode viver um sonho é a coisa mais estúpida do mundo? Eu penso que devemos tentar, acima de tudo, manter a chama de nossos sonhos acesa, à custa de uma quantidade elevada de alguma coisa que eu poderia chamar de esperança, porque esse é o grande combustível de nossos dias, a única coisa que realmente vale no final das contas. Acreditar é uma coisa que exige um esforço enorme, porque quase sempre, dependendo de com qual pé você se levantou de manhã, é impossível evitar pensar em toda a mentira em que a nossa vida se transforma dia após dia, dentro de nós.
É importante aprender muitas coisas diferentes, o problema é que eu penso demais, e na maioria das vezes de forma bastante desordenada. Mas não se iluda, o verdadeiro amor pode estar escondido na sabedoria de vê-lo ir embora e entender que talvez não volte, que é importante aceitar e calar, entender que nunca será do jeito que desejamos, mas da melhor forma possível. A sensação de não ter escolha prolifera-se, desenvolve-se com vontade própria, transborda, foge ao controle, escapa entre os dedos suavemente, como a tinta que corroe o copo descartável, que por sua vez derrete sobre a mão nua e vulnerável. Será a vida se impondo? Descarado livre-arbítrio, que deve ter tirado férias e esqueceu de voltar a seu posto, me deixando na mão. Pobre de nós que não sabemos de nada e achamos que conhecemos alguma coisa. Sequer existe uma forma de resolver o descompasso porque existem coisas que precisamos admitir que não têm explicação racional. Estar aqui é uma forma de dizer “mantenha seu posto, não saia daí, fique mais um pouco”, um pouco mais do que o tempo necessário, tempo pra você fazer o bem, tempo pra deixar sua marca, tempo pra jogar fora, pra doar, pra viver coisas mal vividas e resolver desavenças inventadas com toda propriedade de uma coisa importante. Tempo para jogar as últimas cartas na mesa, impor-se, desabrochar-se. Um tempo pra você, pra esquecer até mesmo o que está toda hora ali na sua cabeça, incomodando, lutando pela sobrevivência, guardando as angústias no fundo do baú, jogando a tristeza pra debaixo do tapete todo dia um pouquinho até formar uma grande nuvem impossível de esconder.
Engraçado como a gente passa por essa vida e sempre parece mais experiente a cada momento e ao mesmo tempo tola a cada descoberta, a gente acaba por morrer lentamente sem saber nada. A vida ainda era como um conto de fadas na minha cabeça até um tempo atrás e de repente eu descobri que o sabor das coisas havia mudado e minha imagem no espelho também. Isso deve se chamar maturidade. Será? Me disseram que é normal que seja assim e o normal sempre me assusta, porque apesar de normal, será que todo mundo se sente assim? Acho que existem coisas nessa vida que nunca saberemos realmente, só ficará lá guardado na imaginação.
"Haverá paraíso sem perder o juízo e sem morrer?"
Talvez o sonho seja mesmo a essência humana. E como tal, efêmero e mutável. O sonho se sente impotente diante da realidade, assim como o homem-sonho diante do homem-do-dia-a-dia.
ResponderExcluir"Somos feitos da mesma matéria que nossos sonhos" (William Shakespeare)