O júnior na minha vida
Quando eu era adolescente [por volta de 1993] e não
sabia nem metade, talvez nem um oitavo das “coisas da vida” que eu sei hoje, e bem nessa época
maravilhosamente confusa, assim como quase todo mundo, eu tive um ídolo. Ele se
chamava Renato Russo e se apresentava quase sempre com aquela voz grave, os
óculos estreitos, cabelos desgrenhados e a barba por fazer. Eu amava ele do
jeito que ele era, como quem ama alguém que está ali do lado, eu era doida o
suficiente para nem querer saber de namorado, porque ninguém parecia chegar
perto de ser como ele. Engraçado como a
gente se engana e não se engana, como a gente erra e acerta ao mesmo tempo,
quase sempre sem querer... Quando ele morreu, em 11 de outubro de 1996, eu
tinha completado quinze anos há dois dias e foi como se uma pessoa da minha
família tivesse morrido. Eu chorei por horas, dias, semanas e até meses. Senti
como se o mundo fosse um lugar muito pior para se viver porque pra mim tinha
morrido um ícone de sabedoria e personalidade.
Renato Manfredini Júnior era uma
pessoa sensível a ponto de parar um show após apenas três músicas por ter visto
segurança batendo em adolescente na platéia. Foi criado nos Estados Unidos e,
após dois anos preso a uma cadeira de rodas, curtiu sua adolescência punk rock
em Brasília. Filho de pais de classe média alta, poderia ter sido muitas outras
coisas, mas resolveu ser ele mesmo e fundou o Aborto Elétrico, até mais pra frente o mundo conhecer Renato Russo. Em
todos os CDs da Legião Urbana (ou pelo menos os de estúdio) é possível ler a frase “Urbana
Legio Omnia Vincit” e o “Força sempre” foi meio que uma filosofia de vida,
até o fim. “The Stonewall CelebrationConcert” foi o primeiro cd solo dele, gravado para a campanha Ação da cidadania contra a miséria e pela vida, do
Betinho, mais ou menos em 1994, e com ele veio a grande mensagem do Renato
sobre como as pessoas que não são iguais a todo mundo devem ser respeitadas,
sem hipocrisia. A idéia do cd veio como uma forma de resgatar o orgulho e os direitos dos homossexuais, por causa
de um incidente que aconteceu em um bar, em Nova Iorque, nos Estados Unidos, há mais ou menos 25 anos (contados à partir de 94), onde gays foram agredidos pela polícia. É possível encontrar, em
quase todos os CDs da Legião, bem como
no site oficial do Renato Russo (http://www.renatorusso.com.br/), uma lista com os nomes de diversas ONGs que
podem ser procuradas para ajudar aos mais necessitados, em diversas situações.
Com tudo isso, eu quero dizer
que, enquanto muitas meninas deliravam pelos rostinhos lindos e corpos sensuais
da época, o Renato era o meu sonho adolescente, aquele cara de barba e óculos,
com a sensualidade de uma vovó de pijamas e a homossexualidade assumida, porque
eu acreditava que ele era o tipo de homem que o mundo precisava, era o meu maior
símbolo de personalidade e beleza, pois as coisas que ele dizia tocavam fundo a
minha alma e isso era tudo o que eu esperava de alguém, independentemente da
época. O cara que dizia “Quero ter alguém com quem conversar. Alguém que depois não use o que eu disse contra mim...”, “Quando se aprende a amar, o mundo passa a ser seu.” ou “Aonde está você
agora além de aqui dentro de mim?”... quando era tudo o que eu queria dizer o tempo todo.
Tenho certeza de que muita gente vai achar estúpido, infantil ou idiota, mas quem já teve um ídolo de verdade sabe que ele nunca
morre na nossa memória e que a influência que ele nos causa não morre nunca também. A
verdade é que hoje, 15 anos depois, eu ainda sinto mais ou menos a mesma coisa
quando ouço uma música ou vejo uma foto. Não importa que digam que ele era bicha, louco, drogado ou seja lá o que for, não importa que eu tenha hoje trinta anos, pra
mim ele foi tudo, foi um exemplo de dignidade e respeito que muita gente do meu lado nunca ofereceu, um exemplo de
humanidade, de força e coragem, que poucas pessoas, independentemente do
gênero, da sexualidade ou da classe social, conseguiram mostrar. Foi o cara que
conseguiu expressar tudo o que eu desejaria expressar se tivesse o talento e a
oportunidade que ele teve, que deixou sua maior contribuição para o mundo: sua mensagem, suas palavras, sua lembrança...
porque, enquanto nós simplesmente passamos pela vida, essas são as coisas que
realmente ficam.
"O cara tinha 26 anos, estava lançando o segundo disco e dava essas ideais super maneiras. Vale lembrar que ele ainda não era o mito do rock and roll nacional. Hoje você vê uma entrevista com a nova safra do rock e eles não falam nada com nada." (igorvillalobos)
***Raridade:
Imagens retiradas de: http://www.renatorusso.com.br/
"Ouça no volume máximo"
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