Vida breve

Sopro de vida, sopro de ar, sopro de cor. Naquele momento parecia uma atitude sentimental e até mesmo infantil demais e, conseqüentemente, um perfil não muito adequado para uma pessoa que desejava trabalhar em uma empresa conceituada e rigorosa. O mundo corporativo às vezes pode ser mais frio do que a gente imagina. Parecia óbvio, já naquela época, que uns vêm e outros vão, assim como é no ciclo da vida, a consciência disso existia, mas era inevitável a sensação de tristeza e solidão que o apego exagerado em uma situação de carência afetiva pode causar. Todos podiam dizer o que quisessem, seria sempre bobo ficar chorando pelos cantos por uma ausência que nem sequer havia acontecido, por uma saudade que ainda não tinha nascido, simplesmente por querer bem a alguém.
O caso é que ele deveria saber o quanto era importante na vida daquelas pessoas e o quanto sua humildade havia ajudado a fazer com que se sentissem em casa, mesmo quando estavam longe daqueles que amavam. Cada gesto, cada momento de descontração e sorrisos, cada instante de atenção, quando todas as outras pessoas nem viam umas às outras. Era preciso, mais do que tudo, naquele momento, demonstrar que são pessoas assim que ficam guardadas na nossa memória eternamente, deixando aquela sensação de que amigos vivem dentro de nós e vão conosco aonde formos. Esse é o tipo de sentimento que vale a pena na vida, e despertando-o nas pessoas estávamos cumprindo nosso melhor papel. Havia uma consciência de que era importante deixar claro aquele sentimento enquanto era possível fazê-lo.
Essa ausência parecia, mas não era realmente uma tragédia, às vezes é preciso milênios para crescermos e entendermos as verdadeiras perdas e tragédias que acontecem na vida. Aquelas em que sabemos que verdadeiramente nunca mais veremos a pessoa, e não teremos outra oportunidade de tocá-la ou ouvir sua voz e sentir seu cheiro. Esse é um tipo de ausência que sentimos e que não é possível curar de imediato e talvez nunca, dependendo da carga que carregamos até ali. Esse tipo de saudade é aquele em que não sabemos o que fazer para sanar porque não é possível enviar uma sms, uma carta, um e-mail ou dar um telefonema. Não importa quantas palavras você diga ou escreva ou quantas lágrimas derramará, porque você nunca saberá para onde o vento levará e nem sequer se fará algum sentido daquele momento em diante. Esse tipo de falta é aquela em que a gente não sabe como reagir, é uma dor surreal que não pára de doer, é uma nova consciência de tudo ao redor e ao mesmo tempo a sensação de que nada nessa vida é para sempre, um despertar para uma realidade frágil que esquecemos todos os dias, mas que é tão límpida e transparente quanto a água que bebemos todo dia: a vida é apenas um sopro de ar, apenas um pulsar de coração, um caminhar, um dia apenas uma memória, um sonho breve.
 “...ele cumpriu sua sentença e encontrou-se com o único mal irremediável, aquilo que é a marca do nosso estranho destino sobre a Terra, aquele fato sem explicação que iguala tudo o que é vivo num só rebanho de condenados, porque tudo o que é vivo, morre.” (Ariano Suassuna)


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