Açaí com granola [com amor]
Desde quando conheceu o rapaz
sentiu seu coração sair voando por aí, por mundos e ares, pelo horizonte, pela
aurora. Não reconhecia aquele sentimento, mas também não tinha interesse em
desvendá-lo demais, só queria viver o máximo possível e estar com ele era
sempre sinônimo de vida extrema. Há muito tempo não se permitia sentimentos tão
lúdicos e há muito também sentia falta daquela deliciosa sensação de final de
infância e começo de adolescência, de quando não se tem ideia do que é vida, do
que se quer, do que se é. Sentia que sua existência precisava desse ar
inesperado, desesperado, inusitado. Precisava sentir-se assim, largada e ao
mesmo tempo querida, surpreendida. Em seus olhos encontrou aquilo tudo e um
pouco mais, e mesmo sabendo que talvez não durasse tanto, pois já tinha
aprendido pelo menos isso, que as coisas realmente boas da vida não duram,
deitou-se ao lado dele e fez de conta que aquele momento era eterno, e por
alguns segundos desejou que realmente fosse eterno.
“Sanidade e felicidade são uma
combinação impossível”, concluiu mais uma vez. Não era a primeira vez que essas
palavras faziam sentido. Olhou para o futuro como se ele não existisse,
imaginou-se vítima de uma doença fatal e incurável e percebeu, então, que não
era vítima nem cúmplice, mas uma insana feliz.
Sabia que precisava repensar
muitas coisas, recuperar os sentidos, reaver o juízo, mas sabia que não ter
juízo era sempre mais divertido e encarava aquele momento como se fosse o
último, sabendo que não iria se arrepender, pois se tivesse que morrer por
aquilo, sentia que morreria feliz, principalmente por conseguir fazer de sua
vida uma coisa que valesse a pena. Fazer o que realmente tinha vontade era um
ato de coragem em um mundo onde as pessoas não se deixavam mais viver o que
realmente desejavam, onde a maioria deixava-se guiar pelos medos e incertezas,
pela visão alheia dos fatos, pela opinião dos outros, por diversos outros
motivos que não fossem sua própria vontade, seus próprios anseios, seus sonhos.
E para quê tudo isso? Para viver uma vida morna? Para ter um mundo de mentiras,
de sorrisos disfarçados nas fotos? Para mostrar aos outros alguma coisa que não
se conseguia mostrar dentro de si mesmos?
Não podia entender, mas naquele momento tinha uma ponta de felicidade, uma pitada de verdade, uma pequena chama de esperança e aventura. Abriu os olhos e ouviu o telefone emitir um sinal que havia se tornado sinônimo de vida. Corria para ver mais de perto como uma criança que corre pra pegar o brinquedo novo. Abriu e deparou-se com a seguinte mensagem:
Não podia entender, mas naquele momento tinha uma ponta de felicidade, uma pitada de verdade, uma pequena chama de esperança e aventura. Abriu os olhos e ouviu o telefone emitir um sinal que havia se tornado sinônimo de vida. Corria para ver mais de perto como uma criança que corre pra pegar o brinquedo novo. Abriu e deparou-se com a seguinte mensagem:
- Quer açaí com granola? To
levando o açaí, vê se consegue comprar a granola.
Sabia que tinha bastante tempo, e
acabara de tomar um banho, mas decidiu procurar pela bendita granola que tanto
enfeitava o açaí, consumido como uma espécie de sobremesa aqui no sudeste do
Brasil. Andou por dois quarteirões, depois quatro, depois um quilômetro ou
talvez um pouco mais. Encontrou um cereal estranho, mais ou menos parecido com granola,
mas ainda achava que servia, na falta de opção. Pegou um quilo, embora soubesse
que iria sobrar e talvez até desperdiçar, jogando o resto todo fora. Passou
pela vizinhança e em frente a uma escola parou, ficou olhando adolescentes no
portão de entrada. Todos sorrindo e brincando, com o portão ainda aberto
esperando, sem saber se entrariam ou não para a aula, com os cadernos nas mãos
e sem objetivo concreto nenhum. Pensou em sua época de escola, em como, naquela
época , também não imaginava nada do que poderia acontecer, do quanto não tinha
ideia alguma das coisas que podem ocorrer a uma pessoa ou a seus colegas que,
naquele tempo, também não faziam a menor ideia. A maioria de suas amigas agora
já tinham filhos, já tinham lares, já eram mulheres feitas, moças do lar, com
empregos e apartamentos vazios e responsabilidades demais. Pessoas com caráter
e coragem, pessoas com objetivos de vida, pessoas com vidas aparentemente de
verdade. Seria sua vida de verdade como a delas?
Olhou novamente para a multidão
em frente à escola e imaginou-se voltando no tempo. Por alguns minutos de
distração, não se preocupou com ninguém mais, com a vida de nenhuma outra
pessoa no mundo. Pouco importava se as outras pessoas viviam verdadeiramente
seus dias na terra, importava-se sim com a veracidade de seus sentimentos, com
seu mundo interior e neste momento sentiu-se voltar ao corpo e à alma de uma
adolescente inconsequente, que com os cabelos ainda molhados do banho, corria
pelo bairro em busca de granola para o namorado recém-conquistado. Há muito não
se sentia arrebatadoramente feliz.
Há muito não sentia sua vida valer a pena e lembrou-se de uma frase que uma vez
lera em alguma revista sem futuro “eu amo estar apaixonado, é o que faz tudo
valer a pena”. Sabia que aquele era um momento único, principalmente porque não
tinha mais quinze anos e esse tempo jamais iria voltar, então correu um pouco
mais até chegar em casa e sentou-se para esperar ele chamar no portão, entrar e
comer o açaí com granola sem fazer a menor ideia das coisas que passaram por
sua cabeça nos poucos minutos em que deixou sua paixão florescer na corrida
contra o tempo e a favor deles dois.
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